terça-feira, 3 de abril de 2012

                                              Prisão do mundo real


(A) - Não acho que a sociedade influa em nosso pensamento individual...
(B) - Baseado em que podes afirmar isso?
(A) - Veja os rebeldes do mundo atual. Todos somos criados para respeitar regras sociais e seguir os preceitos religiosos que imperam na sociedade. Usuários de drogas não se acanham perante a coercitividade paterna. E os homossexuais então?! Seguem a contramão do caminho natural das coisas. Onde quero chegar é que, mesmo que se estabeleça padrões, não são suficientemente fortes para inibir uma  vontade individual.
(B) - Vejo uma certa prepotência em suas palavras. É como se achasse que, como possuidores do poder do livre-arbítrio, ficássemos isentos da parcela influenciadora chamada sociedade.
(A) - Não creio que soe prepotente. É apenas a real situação das coisas.
(B) - Certo. Farei-te uma pergunta. Ou melhor. Explanarei um fato e quero que me diga suas conclusões à respeito dele.
(A) - Fechado.
(B) - Há um tempo eu dividia um quarto com um amigo na faculdade e pude observar muita coisa sobre um ser humano. Ele era aquele típico cidadão da moda, contra leis e do suposto livre-arbítrio por você defendido. Sempre me dizia que fazia o que lhe desse vontade. E pude constatar tal fato. Nas baladas noturnas ele sempre acompanhava-se das mais belas - e burras - garotas da faculdade. Desfilava marcas, do sapato ao carro importado. Bebia e se achava o fora-da-lei. Certa vez ele trouxe uma garota para ajudá-lo com afazeres da faculdade lá pro quarto. Era notável a admiração dele para com ela. Garota inteligente, bem instruída. Feia e pobre. Reestruturarei melhor essa última frase: garota inteligente, mas feia. Bem instruída, mas pobre. E era visível a contradição. Ele a admirava. Mas o desvio do padrão social que ela possuía, o afastava à mesma proporção que aproximava. Não sei se consegue captar a situação. Mas imagine aviões. Um exército deles. Nós, cidadãos comuns, encontramo-nos abaixo de suas hélices. Agora visualize esses aviões despejando algumas coisas: marcas famosas, modelos internacionais, religiosidade, modos de pensar e agir e, por último, um pacote chamado senso comum. Agora imagine que esses aviões estão logo acima de seu cérebro, e tudo que despejou, impregnou no mesmo. Retome o garoto da faculdade que eu havia falado e veja-o composto das coisas jogadas pelos aviões. Você percebe que o cérebro dele foi moldado? Encaixado em um muro chamado padrão social, que amedrontava seus próprios desejos intrínsecos? Olhe para você. Por quê usa essas roupas, este cabelo penteado e traz consigo o pensamento de que somos livres? Lhe explico o porquê. Você está preso. Preso no muro asséptico. Sim. Limparam-lhe quaisquer perspectivas de liberdade real. Acredito que temos livre-arbítrio. Mas é um livre unido ao preso. As vendas que lhe impedem de enxergar a realidade chama-se falsa liberdade. Não acho que deveria realmente acreditar que és dono de tua própria vida. 
(A) - Você me dizendo tais coisas me faz sentir-se envergonhado.
(B) - Não acho que seja essa a palavra mais adequada. Só queria lhe mostrar que somos regidos por uma lei natural: a da artificialidade humana. As minorias que você citou no começo quebraram alguns blocos do muro asséptico. Mas, enxergue com amplidão. Eles impuseram suas vontades sob um fator em centenas existentes. O resto lhe é imposto socialmente e até mesmo, sem querer.
(A) - Quer dizer que nunca estarei livre dessas amarras sociais?
(B) - Essa é a prisão do mundo real. Seja bem-vindo.

7 comentários:

  1. TEXTO PROFUNDO.... BRAVO

    http://dicasdadacy.blogspot.com.br/

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  2. tem certeza na "naturalidade" dessa lei?

    Somos naturalmente artificiais ou artificialmente naturais?
    o texto tem uma conotação interessante, mas sugiro que vc leia algo sobre o Monarch mind control ;)

    Tiago Guillen

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    1. Acho que nos tornamos tão artificiais, que isso passou o limite do sintético e adentrou o território da natureza humana.

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  3. Texto interessante...
    parabéns!
    Venha nos ver
    http://uaimeu10.blogspot.com.br/2012/04/as-melhores-coisas-da-vida.html

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  4. Concordo! Temos nossa liberdade mas não somos totalmente livres, só refletir que somos obrigados a votar -um sentido mais figurado, e não menos real de como estamos sendo influenciados toda hora pela sociedade; mas vai além, o jeito de nos vestirmos (o TER que nos vestir?!), as leis que temos que obedecer (para que não influenciemos na liberdade do alheio), e são detalhes que muitas vezes passam despercebidos. E saímos por aí falando em nossa TOTAL liberdade, como o garoto do texto que acreditava ser livre e era influenciado o tempo todo, mas sem sequer pensar se era livre ou não na sociedade.

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  5. Fantástico e muito real.
    Foi uma boa visita que fiz aqui, texto muito bom!

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  6. O eterno conflito da liberdade. E o pior é que quanto mais livres nos sentimos, mais presos estamos e o máximo que podemos fazer... é tentar escolher o que influenciará nossas decisões.
    Muito bom o blog!

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