terça-feira, 3 de janeiro de 2012


            Bocas fechadas também fazem entrar mosquitos...

Tom era um jovem de vinte e poucos anos. Embora novo, longe do auge de sua maturidade, desde pequeno tomou suas próprias ‘’decisões’’.
 - ‘’Quero a branca’’. ’’ Flocos’’. ‘’Flamengo’’.
Sempre sério e austero, sabia o que era o melhor para si. E ai de quem resolvesse opinar! Contrariá-lo era pior que mexer com fogo.  Foi crescendo e, junto com os ossos, cresceram sua autoconfiança e seu poder de decisão. Fez amigos e mais amigos. Namorou meninas e mais meninas. Mas parecia que Tom era transitável. Nunca dava certo com ninguém. Sua mãe o instruía. Simplesmente por ser um ato reflexo de mãe, já que nada impedia o filho de fazer o que queria. Seu pai, embora fosse inteligente por demais, sempre acabava sendo rebaixado pela prepotência e arrogância do ‘’sabia-tudo’’ Tom.  Em determinado dia, o rapaz apareceu levemente alterado. No dia seguinte, são. Uma semana depois, num sábado – ou domingo, confesso que estou a inventar datas, já que essa etapa nunca foi o meu forte – dormiu fora de casa. Um homem de vinte e poucos anos é natural dormir longe da própria residência algumas vezes. Certo, prossigamos. Em um período de dois meses, Tom havia mudado por completo. De revolucionário andante a pacato cidadão. De sagaz e decidido a inquieto e marrento. Certamente, preocupou os pais, familiares e pessoas mais próximas. Porém, como criou-se o mito ‘’ não indague Tom, você sabe que ele não gosta...’’ , ninguém teve a coragem de instigá-lo a mostrar o que acontecia em sua vida.  Hoje, Tom, que pesava aparentemente não mais que oitenta quilos, pesa mais de duzentos. Cento e vinte quilos a mais de pura terra. Um pouco mais um pouco menos. É difícil estimar o peso que pressiona a cabana dos mortos. Tom havia se tornado viciado em heroína. Sempre soube dos desencantos da vida. Sempre entendeu o mundo ao seu redor e buscava suas aspirações. Contudo, o simples fato de achar-se o mais decidido do mundo, o fez acreditar que não seria afetado. Afinal, sabia que sabia parar. Ao menos acreditava nisso assim como acreditava que o sorvete de flocos era o mais gostoso quando criança. Como acreditava que as roupas brancas lhe caíam melhor. Como sabia que o Flamengo era o seu time de coração.  E seus pais e pessoas próximas imaginavam que, o simples fato de Tom pensar saber tudo, bastava para sua criação. E hoje ele está lá. Lá mesmo. Nada de cá. Tão longe que há pessoas que demoram mais de cem anos para chegar ao fim de tal viagem. E sabe por que isso tudo aconteceu? Apenas porque houve o medo das pessoas. Receio. Se tivessem perguntado a Tom o que lhe acontecia, talvez saberiam que ele havia perdido emprego. Namorada. E a vontade de viver. Mas, sabe como são os humanos. Cheios de vergonha. Ansiosos para que todos resolvam a própria vida. Entenda. Ajudar não cansa. Perguntar não fere. Esclarecer não destrói. Uma vida poderia ter sido salva. Pense nisso como eu ando pensando. Olhe para a pessoa que senta ao seu lado. Pergunte como vão as coisas. Indague. Ofereça-se. Fazer o bem, convém. Diálogo e sabedoria. Com um pouco de cada, não há quem fique pra trás. Com um pouco de cada, não há quem não possa escorar o passo do próximo. Até porque, bocas fechadas também fazem entrar mosquito. Tom está cheio deles agora. 

Um comentário:

  1. Rafa... simplesmente FANTÁSTICO!
    Rs, eu demorei, mas eu disse que iria ler o seu blog ;) ah, e por sinal, não me arrependo de ter entrado aqui novamente para ler!

    Fiquei simplesmente surpresa com o final da narrativa... foi fantástica! Sua escrita é muito bem articulada. Meus Parabéns!

    Shay ;)

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